Idolatria |
Escrito por Jayme Lobato |
Ter, 15 de Fevereiro de 2011 13:04 |
Hilda era médium e muito festejada como exuberante expositora. Seus amigos a admiravam de uma forma também entusiasmada. - Hilda é fora de série! Quando fala me sinto elevada a planos superiores! - Também acho, Helena! Na presença dela sinto-me em clima espiritual das alturas! E você Heitor, não diz nada? - Parece até que não me conhece, Ruth! Sou o fã número 1 da Hilda. Sinto-me privilegiado por ser merecedor da sua confiança! E Helena volta a exaltar a companheira. - Outra coisa, pessoal: são inúmeras suas faculdades! Tenho a impressão de que ela é a reencarnação de figura importante do passado histórico de nossa civilização! - E a vidência dela! Extraordinária! - exclama Ruth. E Heitor corrige: - Vidência não, Ruth! A Hilda é clarividente. Às vezes, fico até com medo de fazer alguma coisa errada e ela descobrir, pela clarividência! Aí, Ruth se assusta: - Os guias podem informá-la de nossas possíveis traquinagens! Nossa! Até me arrepio, quando penso nisso! O bom, é que sou certinha! Nesse instante, sem mais nem menos, Helena conclui: - E a Hilda é uma missionária! Ruth não quer ficar para trás nos elogios e diz: - E vocês estão esquecendo da humildade da Hilda! Que falar do seu carisma!? - Falando nisso, lembrei-me de um caso ocorrido há poucos dias! Vários companheiros se dispuseram a acompanhá-la em palestra que iria proferir num centro espírita na Zona Norte! Heitor confirma. - Eu estava nesse dia, Helena! - Ela, então, pediu aos companheiros que se dividissem. Alguns ficaram no centro, orando pelo bom êxito da sua tarefa, enquanto outros foram com ela, em caravana! Ruth, aproveitando o enlevo dos companheiros, exclama: - Que atitude! Que humildade! Devemos tê-la como nossa orientadora, nossa mestra! Romualdo, participante do mesmo centro e experimentado nas lides espiritistas, ouvia a conversa. Acha seu dever participar. - Vocês não acham que estão exagerando, companheiros?! E Helena se irrita: - Lá vem o Romualdo com a conversa de sempre! - Ah! Helena! Ele não confia na mediunidade da Hilda! - retruca Ruth. Heitor sai em defesa da médium: - Pois eu não! Acho Hilda uma médium sem retoques! - O que prova o total desconhecimento, por parte de vocês, das obras de Allan Kardec!- afirma Romualdo. Helena, irritada, questiona: - E o que essas obras poderiam conter que contrarie nossas opiniões?! Ruth a acompanha: - Nada pode haver, pois o que falamos nos é ensinado por Hilda, que conhece todos os livros de Allan Kardec. - E vocês?! Já leram algum deles?! Já participaram de algum estudo dessas obras?! - pergunta, resoluto, Romualdo. - As preleções de Hilda me bastam! - responde Heitor. - A mim não bastam não! Apesar de não encontrar, aqui no centro, apoio para instituição do estudo, tenho buscado estudar com atenção as obras kardecianas! E venho aprendendo muito sobre Espiritismo. - Mas, Romualdo, o que dissemos e que contraria os ensinamentos de Kardec? - Ora, Ruth! Vocês propõem para Hilda a condição de médium perfeita, não é mesmo?! Helena confirma: - É assim que penso! - Pois bem! Há dias, estudando O Livro dos Médiuns, de Kardec, no capítulo XX, item 9, anotei a seguinte pergunta que ele fez aos Espíritos Superiores: - Qual seria o médium que poderíamos considerar perfeito? E Heitor agitado quer saber: - E qual foi a resposta?! - Uma nova pergunta: - Perfeito? É pena, mas bem sabes que não há perfeição sobre a Terra. - E ainda acrescentaram: - Digamos antes bom médium, e já é muito, pois são raros. O melhor, afirmaram, é o que, simpatizando somente com os bons Espíritos tem sido enganado menos vezes. Ruth não se conforma: - Esse final acho injusto! Hilda não é enganada pelos Espíritos inferiores! - Esses ensinamentos de Kardec estão ultrapassados! - assevera Helena. - Mas, Helena, você nem conhece a obra de Kardec, como pode afirmar tamanha tolice! - E Ruth arremata: - Noutro dia, numa reunião dos amigos do peito da Hilda, ela nos confidenciou que alguns Espíritos, que a instruem, acham que nas obras do senhor Kardec há alguns enganos! - Eu estava presente! Mas isso é informação confidencial, Ruth! - exclamou Heitor. Helena, então, se exaspera: - Mas, esperem aí! Eu não soube dessa reunião. A Hilda não faria isso comigo: promover uma reunião sem me convidar?! Não acredito! Ruth tenta acalmá-la: - Você estava viajando, Helena! Foi quando de sua ida a Salvador! - Ah, bem! Não poderia acreditar que minha amiga traísse a confiança que nela deposito! - Pelo visto, o problema está mais sério do que imaginava! E Heitor não se conforma: - O que você quer dizer com isto, Romualdo?! - Se os instrutores espirituais de Hilda informaram realmente o que estão me dizendo é sinal que o caso está muito sério, meus amigos?! - Explique-se melhor, Romualdo! - exige Helena. - Uma informação desse teor somente poderia vir de espíritos inferiores! Está patente a fascinação! Aí, Heitor culpa Ruth. - Por isso, Ruth, é que Hilda nos pediu para não comentarmos esse assunto, pois seríamos incompreendidos! - É! Realmente errei! Falhei nessa! - No meu entendimento, vocês não são espíritas! Heitor mostra descontentamento com a afirmação de Romualdo: - Que absurdo! Sempre fui espírita! Sempre acreditei nos espíritos! - Vocês não seguem a Doutrina Espírita! Vocês seguem a Hilda. Portanto, vocês são "hildistas", e não espíritas! Na semana seguinte, no centro, chega uma notícia aterradora: Hilda deixara de ser espírita, desiludida com doença grave de um de seus familiares! E Ruth, que a idolatrava, comenta: - Não acredito mais em nada! Nem no Espiritismo! - Mas, Ruth, quem te decepcionou não foi o Espiritismo! Foi a Hilda! Você não acreditava na Doutrina Espírita, pois nem a conhecia, para poder dizer se acreditava ou não! Heitor mostra sua inconformação: - Que decepção! Como ficaremos?! A Hilda é uma farsante! - É hora de vocês terem caridade para com ela, companheiros! - sugere Romualdo. Helena, revoltada, brada: - O quê?! Caridade para uma impostora?! - Não era esse o pensamento de vocês há duas semanas atrás! Helena tenta se explicar: - Mas também não a imaginávamos capaz de uma atitude dessas! - A Hilda é humana, gente! E, mais sério ainda, não tinha compromisso senão com ela mesma - com a sua notoriedade e estrelismo. A Doutrina Espírita não fazia parte de suas prioridades! E vocês a aplaudiam! E Romualdo tivera oportunidade, então, de propor reformas para aquele grupo. Passaram a estudar as obras de Allan Kardec nas reuniões públicas. E, mais tarde, instituíram o estudo sistemático dos livros da codificação. Ali, então, se instalara o Espiritismo, conforme proposto nos ensinamentos dos Espíritos Superiores, organizados e divulgados por Kardec. Boletim de Abril/2006 |